O Zé e a lagoa.
“O pior lixo não é o lixo. O pior lixo é o que joga esse lixo”, diz José Cavalcante, mais conhecido como Zé da Rádio, de 45 anos, enquanto anda pelas regiões poluídas das lagoas da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Amante da natureza, este locutor de rádio pernambucano decidiu cinco anos atrás que moraria na lagoa Jacarepaguá, uma das mais sujas da região, para limpá-la. Hoje ele mora com sua família, sua esposa Barbara e seus dois filhos de três e cinco anos, dois cachorros, 10 galinhas e um galo da Índia numa precária casa à beira da lagoa na zona oeste do Rio.
Com seu barco amarrado no quintal da casa, sai todo dia para percorrer a lagoa na procura do lixo preso nas margens. Num percurso de duas horas pela manhã e pela tarde, ele consegue tirar 30 toneladas por mês de diferentes materiais recicláveis, como garrafas PET, cadeiras e brinquedos de plástico, e outros nem tão recicláveis como sofás, colchões, TVs de tubo e seringas.
A missão parece não ter fim. A lagoa Jacarepaguá, afinal, possui um estoque de lixo renovado todos os dias. Com afluência de diferentes rios contaminados da região que passam por comunidades, a região também sofre com o esgoto sem tratamento de condomínios que emanam gás sulfídrico altamente tóxico para o ser humano. Isso faz com que tilápias boiem na beira da lagoa e produzam uma superpopulação de gigoga, um elemento de filtrador que se alimenta de matéria orgânica e provoca abafamento do oxigênio da água, degradando-se num líquido verde e espesso. "De noite ardem os olhos e o nariz", diz Zé. "Tem cheiro de podre." Os efeitos desse gás, fruto da decomposição, são perigosos para nosso organismo. Ele afeta as mucosas respiratórias e ocular provocando fortes irritações.
Embora a lagoa tenha recebido promessas de despoluição na época dos Jogos Olímpicos do Rio 2016, nada foi feito até agora. O projeto mais eficaz acaba sendo o de Zé do Rádio. Com página bem visualizada no Facebook, o "Voz das Lagoas", Zé grava vídeos com ajuda de sua mulher em que mostra a situação lamentável da lagoa. Ele também mostra como, até agora, plantou mais de 109 mil pés de Rhizoflora, uma planta do mangue que funciona como elemento filtrador nas margens e diminui os índices de poluição nas águas.
Seu sonho agora é comprar um grande barco adaptado especialmente para coleta de lixo em água com apoio financeiro das associações e condomínios da Barra da Tijuca. "Quem sabe assim qualquer pessoa possa tomar banho sem problemas como era há 45 anos", diz.